Será Tristeza?

Será tristeza o travo
tão azedo
que eu engulo sem ter maior razão?
Será a decepção ou talvez
medo
de ter à minha frente uma visão
de como frágil é
a amizade
que fez meu coração atrás feliz,
Que dei sem ser pedida
é verdade.
Eu só agi assim porque eu quis.
De nada estava à espera,
nem pedi,
pois trago junto a mim, sempre comigo
provérbio chinês que
há muito li,
saber real dum povo bem antigo:
-“Se gostas de um amigo
de verdade
e queres o seu afecto conservar,
não cobres nunca nada
pela amizade
e dá-lhe um barco para se afastar”.
Mas tal não foi preciso,
pois sumiu,
volátil como éter destapado
que deixa um aroma
subtil
mas pode ter um gosto envenenado.
Será talvez por isso que
me custa
o tal travo azedo engolir.
Eu penso que não foi
maneira justa
de vê-la assim partir, de mim fugir.
No meio de insónias
eu pergunto
quais foram, se os tive, os erros meus.
Gostava de saber porque
assunto
não tive nem direito a um adeus.

Mas eis que toda a mágoa
se dissipa
num misto de rubor e tremedeira.
Vai com medo o dedo
que clica,
não caia eu abaixo da cadeira
ao ver sua mensagem.
Que surpresa
se vai com os cliques desvendando.
Não sei qual é a frase
que mais pesa,
por isso continuo clicando.
Já li o seu email vezes
sem fim
tentando apagar folha final.
Pensar qu’escritas foram
para mim
e só p’ra mim as frases que tão mal
eu vejo, devido ao
ardiume
por ter os olhos já humedecidos.
Será talvez um pouco
de ciúme,
saber que você tem muitos amigos.
Consola-me uma ideia
nesta estória,
a ela me agarro com ardor:
Ainda estou gravado
na memória
do disco desse seu computador.
O barco que lhe dei já deu
à costa.
Espero que o faça normalmente
pois tem aqui um cais que
de si gosta.
Atraque e repouse calmamente.

PS ( Post scriptum)
Não mande este mail a
outro amigo,
porque ele é exclusivo para si.
Palavras que bem tento
e não consigo
calá-las, elas saltam para aí
p’ró meio do écran com
grande impacto.
Se delas não gostar nem necessite
é só seleccioná-las
com o rato,
depois é pressionar botão delete.

Palavras, leva-as o vento!



Escrevo mentalmente
as palavras
em folhas virtuais bem escondidas.
Eu quero que elas fiquem
como escravas,
não quero que elas fujam atrevidas.
E vou com paciência
esperar
o vento que assopra prós seus lados,
lançá-las com carinho
pelo ar
querendo que lhe levem os meus fados.
Por isso esteja atenta à leve
brisa
que teima em desmanchar o seu cabelo.
Não queira penteá-lo,
nem precisa.
O vento entretém-se a tecê-lo
em golpes que o levam
para trás,
a ver se descobre o seu ouvido.
Sussurra, como só ele
é capaz,
a música que leva a meu pedido.
A mão, atrás da nuca
sem esforço,
segura os cabelos tão revoltos.
O ar envolve então o seu
pescoço.
Em breve a sua mão os deixa soltos,
rebeldes e tão livres como
o vento.
Ondulam ao sabor dessa canção,
que mesmo sem o seu
consentimento,
abana o seu frágil coração.
Escute lá no fundo
a poesia
que chega até si desta maneira.
Pergunte ao coração
o que queria,
ainda que a cabeça não o queira.
E faça um vira-vento
de papel.
Assim sabe se o vento é de feição
que vá roçar de novo
sua pele,
levar junto de si nova canção.

Franquezas



Fra(n)quezas vai ainda no início,
em fase muito verde, experimental.
Eu sei que é prematuro, faço mal.
Humilde reconheço este meu vício,

querer mostrar à pressa tudo feito,
que junto ao pecado da vaidade.
Nem o passar do tempo, da idade,
me cura deste meu pobre defeito.

Por isso estas linhas apressadas
estão em suas mãos, já, excitadas
querendo um juízo exigente.

Por isso escolhi a minha amiga.
Porquê? Eu sei e deixe que lhe diga:
- Por ser uma leitora que não mente!

Mente Delirante


Não sei o que fazer para lidar
com esta nova força interior
que torce o meu ser num estertor,
em forte convulsão ou num esgar.

Pareço mulher prenhe em fim de tempo
depois de nove meses da semente.
Rebentam-me as águas de repente
e tenho de parir um sentimento,

ideias e, às vezes, confissões
que levam a que peça mil perdões
a quem nada pergunta, confiante.

Parece uma válvula de escape
que mostra bem, por mais que eu as tape,
fraquezas de uma mente delirante.

Perspectiva


É tudo uma questão de perspectiva,
de ângulo ou então ponto de fuga.
Mexendo só um pouco tudo muda,
trocando a verdade respectiva.

O mesmo acontece com nós dois,
parece que uma lente nos separa.
Dum lado você vê a minha cara,
do outro eu vejo o brilho de mil sóis.

Procuro endireitar eu esta lente,
torná-la um simples vidro transparente
que nunca nos distorça a realidade.

Apago alguns sóis desse seu lado,
aumento eu a seus olhos um bocado
fazendo equilibrar a amizade.

Matemática



A nossa relação é Matemática
da simples, da lógica, da pura!
Por isso é que você não me atura
a minha letra ou prosa mais enfática.

Por mais que um número seja positivo,
cruzando sinal mais com sinal menos,
já todos nós há muito que sabemos:
No fim o resultado é negativo!

Queria relação muito mais Física.
Eu falo – não de corpos – de Ciência!
E esta também pura, erudita.

Vejamos em dois ímans essa mística
que une em qualquer experiência
contrários numa força inaudita.

Deserto


Estou seco, estéril, um deserto.
Invejo-lhe a Fé, a alegria
que você põe no simples dia a dia.
Invejo as pessoas que estão perto

que podem degustar a companhia
de alguém que eu tinha como certo.
Agora só me sobra um aperto,
a mim tão despegado., Quem diria?

Já tive tudo perto ao meu alcance,
bastava chegar cedo e num relance
eu via o mundo certo, como eu queria.

Agora, tarde ou cedo, não importa,
há sempre um vazio à minha porta.
A Fé essa vai longe, fugidia.

Clandestino


Escrevo às escondidas, clandestino,
na sombra, na penumbra, no escuro.
Mas mesmo assim o verso sai tão puro,
a falta de razão não tem mais tino.

Pareço um vulgar ladrão de igreja,
um rato encolhido, um fantasma,
um tísico com tosse e com asma,
um peito inflamado e que arqueja.

E tudo o que escrevo é tão limpo,
sem mácula, sem podres, sem pecado,
em linhas sem pudor e sem razão.

Apenas lhe escrevo o que sinto:
Saudades a que estou eu condenado,
um trapo que me esconde o coração.

Sol Da Meia Noite


Estava habituado à sua luz,
um sol nascia todas as manhãs,
deixando a noite escura para trás,
um brilho a que o ouro não faz jus.

Perdi esse seu brilho de repente,
caí na mais profunda escuridão.
Escuros os meus dias assim são
e cego, apalpando, vou em frente.

Eu tenho de mudar de atitude,
buscar outra fortuna, outra sorte,
depressa antes que a vida me açoite.

Também posso mudar de latitude,
viver, um esquimó, no Pólo Norte.
Você será o sol da meia-noite.

Horas Trocadas


Estou, não sei porquê, de horas trocadas,
os dias uma grande confusão.
Não é que eu não saiba que horas são
ou mesmo porque estão tão baralhadas.

O Sol trocou a hora de nascer,
agora ele nasce só de tarde.
Eu sei bem a que hora ele arde,
me aquece e me faz estremecer.

Os dias esses andam muito curtos.
E conto para dentro os minutos
que faltam para um sorriso meu.

Parece que é sempre de Inverno!
Pois, mesmo sendo quente e muito terno,
o Sol cruza depressa o meu céu.

Estrela Polar


Eu entendo a sua relutância
em ser um simples sol que me alumia.
O Sol é na Galáxia, quem diria,
estrela de tão pouca importância.

Será de qualquer modo uma estrela,
não pode ocultar esse seu brilho.
Emana essa luz... É um sarilho!
Os olhos pestanejam só de vê-la.

O Sol está bem perto, mas você
há muito tempo que ninguém a vê,
está num outro céu a flamejar.

Os seus conselhos são como um guia
que tornam bem melhor meu simples dia.
Para mim é uma estrela: A Polar!

Cordão Umbilical


Eu sinto entre mim e outro alguém
a forte ligação tão visceral
que existe num cordão umbilical
unindo o meu ser um pouco além.

Eu sei que isto é puro delírio,
não passa duma frágil fantasia
que serve à medida à poesia
fazendo aumentar o meu martírio.

Eu sinto-me outra vez como um feto,
preciso de carinho, de afecto,
sentir que logo, em breve, serei gente.

Serei mais facilmente um aborto
se esta gestação der para o torto.
Incrédula, a mãe está inocente.

Mudanças



Aviso desde já a minha amiga:
-Não fique perplexa se as notícias
ficarem espaçadas e resquícias.
Por mim eu vou tentar, talvez consiga

mandar-lhe entre hoje e amanhã
as novas que se passam cá no burgo.
Assim me livro, lavo e me expurgo
de alguma má memória ou coisa vã.

Estou a pôr já dentro dos caixotes
os restos de uma era que passou,
em gestos sem valor e sem vontade.

Há coisas que não cabem em pacotes
memórias que o tempo não levou.
Ficaram sob a forma de Saudade.

Atraso


Desculpe, querida amiga, este atraso.
Não foi intencional, nem de propósito.
Em qualquer ecoponto há um depósito
aonde só por sorte, mero acaso

o meu computador não foi parar.
Eu já chamei o Mário outra vez
P´ra ver a porcaria que ele fez,
pedir-lhe p’ra de novo o consertar.

Assim eu arranjei outro caminho
que chega até si. E com jeitinho
você vai receber esta notícia.

Envio em rodapé mais um abraço.
No fim deste soneto que lhe faço,
um beijo despojado de malícia.

Email

Espero encontrá-la prá semana
aqui neste ecran, como é costume.
Prometo não soltar nem um queixume,
falar com a alegria de quem ama

o sol, a chuva, o frio e o calor
a vida , os amigos, a leitura
das linhas que me escreve com ternura.
Prometo à minha vida dar mais cor.

Só quero que me mande alguma tinta
de cores que nunca foram inventadas,
nuances tão suaves e discretas.

Farei uma pintura que não minta,
que diga em verdades libertadas
as minhas confissões antes secretas.

Puxão


Estou já com o fio numa mão
disposto a arrancá-lo da parede.
Hesito e a mão quase que mede
a força que precisa pró puxão.

Agora já não há nada a fazer!
Vou cortar o cordão umbilical
e fico à espera dum sinal,
um Génesis, um novo renascer.

O fio bem estica mas não sai,
mais força e a parede quase cai,
caindo como ela sonhos meus.

Está quase a sair, nem acredito!
Espero que ainda passe este grito
que leva o meu último Adeu............

Lembrança

Procuro, entre as brumas da memória,
resquícios do seu rosto, uma lembrança.
O tempo em que a vida se entrança
já teima em apagá-lo sem glória.

Agarro os sorrisos que me deu,
os gestos que trocamos, já distantes.
Fugazes, tão pequenos os instantes,
tão leves e tão finos como um véu.

Envolto nesta bruma de saudade,
em névoa tão discreta, vaporosa,
espero paciente, firme, aqui.

Escrevo cada vez com mais vontade,
criando em cada verso uma rosa
que cuido com ternura para si.


Fruta Seca

Escrevo esta carta em poucas linhas,
a isso o soneto me obriga,
é só para dizer, querida amiga,
as férias acabaram, comezinhas.

Uns dias no campismo, em beleza.
Lembrei-me eu de si, vários momentos,
pois sei que também faz acampamentos,
que gosta do ar livre e natureza.

No meio da Feira Medieval,
da qual eu gostei muito, por sinal,
você veio, de novo, à minha mente.

Havia uma barraca bem sortida
de toda a fruta seca, mas amiga,
não tinha pêra seca, infelizmente.

Doçuras


Eu dei aqui comigo a pensar
em tão pequenos gestos que eu perdi.
Surpresas que eu trazia para si,
doçuras que a faziam engordar.

Agora bem as vejo atrás dos vidros.
Sorriem atrevidas para mim,
mas ficam quietinhas lá assim.
Não ligo patavina aos seus sorrisos.

As natas, clarinhas, limonetes,
parecem saltitantes diabretes
que gozam com a minha atenção.

Pois fico a olhá-las muito atento,
lembrando como fui feliz um tempo.
Agora olho para elas, digo NÃO!

Boato?

Estou admirado, perplexo!
Não sei como abordar mais este facto.
Notícias que me chegam (ou boato?),
histórias que pra mim não têm nexo,

indicam que você, minha amiga,
mudou, não só de emprego mas também,
faz hoje ( pra seu mal, ou pra seu bem)
função bem diferente da antiga.

Se há quem o afirme com frieza
já eu fico na dúvida, pergunto,
se há qualquer verdade nisto tudo.

Esteja onde estiver tenha a certeza:
Por muito que me custe este assunto
na nossa amizade nada mudo.

Abraço

Pudesse eu chegar-me sorrateiro,
tão leve que abafe o meu passo,
e terno envolvê-la num abraço
sentindo um arrepio verdadeiro,

mostrando assim que gosta que a abrace.
Voltá-la para mim e francamente
olhá-la bem nos olhos, bem de frente,
e ver leve rubor na sua face.

Surpresa que lhe solta a emoção
e quase lhe rebenta o coração.
O meu há muito tempo rebentou.

Não fez muito barulho. Em resposta
apenas um suspiro de quem gosta.
Ninguém viu e você não reparou.

Quarenta

Está à sua frente nova era...
Dos intas para os entas é um passo!
É dá-lo, resoluta qual compasso,
o tempo não se atrasa nem espera.

E veja você mesma os sinais
da vida que viveu até agora.
E tudo guarde, nada deite fora
nem mesmo os pedaços mais banais.

Vai ver em cada ruga uma estória...
E sejam de fracasso ou de glória
são suas, são a dor do crescimento.

Um passo bem pequeno, um segundo.
Você está igual!!! E todo o mundo
se curva ante si neste momento.

Comentário

Um simples comentário pessoal,
um leve destapar de opinião.
Você esconde bem a emoção,
não mostra para mim nem um sinal

daquilo que lhe vem ao coração,
aflora ao de leve a cabeça.
Por mais e mais e muito que eu lhe peça
não tenho eu resposta e sem razão.

Eu sou hoje ainda um aprendiz
e que não sabe ainda se bem diz
aquilo que lhe vem ao pensamento.

Procuro uma palavra minha amiga
que seja a sua boca que a diga
e traga para mim o seu alento.

Divindade


Espero eu que nunca me interrogue,
olhando-me nos olhos, bem no fundo,
quem gere a minha escrita, este meu mundo,
que mais parece um templo, um pagode,

a uma divindade proibida,
num culto transcendente, isotérico,
que exulta no meu verso mais histérico
a deusa da paixão mais escondida.

Iria eu mentir-lhe concerteza
guardando para mim esta fraqueza
que tanta força faz na minha escrita.

Negar-lhe a evidência mais clara
que mais perece um vício, uma tara,
não fosse esta dor que aqui grita.